ARMANDO FREITAS FILHO
Sempre senti falta de poemas do Armando Freitas Filho em Poemargens, aliás a lista de grandes ausências é imensa,isso infelizmente é inevitável. Há décadas acompanho a trajetória desse extraordinário poeta brasileiro, radicado no Rio de Janeiro. Hoje resolvi publicar alguns trabalhos estampados no livro 3 x 4, Nova Fronteira, de 1985. A escolha é bastante aleatória, acredito, no entanto, que sirva para contaminar meus parcos visitantes a buscarem nos livros do poeta outros momentos de alta voltagem.
Adriana Varejão
POEMAS
I
Uma viagem a descoberto:
ave, aventura
e seus voos cegos!
Sem espelhos retrovisores
só assim
me visto, somente
com a paisagem
e sem assinar meu nome
em nenhuma parte
eu passo
                e me assassino:
sol assim.
(p. 38)
II
Leio, de um só gole
o que não sei:
as instruções de voo
um lance de degraus
no escuro
                      um livro de dados
um palco sem aplausos
um lince de dígitos
disparado, não deixando
indícios, grãos, índices.
Ao azar, sobram as asas
de um desastre, cenários
atos falhos, alguns planos
e um papel em branco.
(p. 49)
Adriana Varejão
III
Vou gota a gota
aos poucos
mas apesar de todo cálculo
e de tanta cautela
acabo não me poupando
pois estou sempre na ponta
do trampolim
e o tempo aí já não cuida
de segurar nada - não sabe -
conter-se nem contar
o que de fato aconteceu:
se foi voo, queda ou mergulho.
(p. 75)
IV
Somos luvas da mesma mão
e somente no delírio
vamos saber qual é o som
do aplauso.
a outra caiu na rua
ou ficou esquecida no hotel
e só no espelho podemos
ensaiar a ilusão e a lembrança
e dar adeus à que se perdeu
e quebrou
almas gêmeas, alianças
algemas, e partiu.
(p. 77)
V
Debaixo da luz do flash
com todos os fósforos
velas e watts acesos
à queima-roupa
a chama de sua nudez
lambe-lambe
e ateia fogo à pele
de papel couché
que se consome e sua
por todos os poros, a cada pose
do corpo ou do incêndio
que se despe.
(p. 93)
Adriana Varejão
VI
Passar a limpo os cinco sentidos.
Apagar com sono e borracha
para usar - todos -
novos em folha
de novo:
sem luvas, óculos, fones
perfumes de meio ambiente
e com a boca livre de lembranças.
(p. 110)
VII
Diante de mármores
e espelhos
que sempre esperam
mesmo quebrados.
Tudo tão magro
e feito a esquadro.
Entre álgebra e fábula
o meu sangue sabe mais
do que este livro conta.
(p. 115)
VIII
Sem gravidade.
Antes de cair, deus algum
ou seu simples desejo
precisa de asas.
Sequer de luz
pois no rascunho
já há risco
                      de fósforos
de rostos feitos de terra
e de erros das estrelas.
(p. 120)
IX
As veias da família
são iguais
e atendem pelo mesmo ramal.
Os pais estão em toda parte.
No escuro, na escuta
nos espelhos
respondendo a todas as chamadas
até quando não são feitas
em voz alta
e o telefone não toca.
(p. 121)
Adriana Varejão
X
Dentro
não se fotografa.
O que vem antes
até o topo
o espectro que nenhum
espelho capta
que pega a pista e larga
mas não deixa marca
impressão digital.
O antirretrato
zero à esquerda
longe do papel da estátua
o pré-fantasma que a luz velou
e perdeu a memória
além do seu próprio negativo:
não.
(p. 125)
XI
Preposições: antes, até, após
por quanto tempo
este crime ficará perfeito
fora de foco entre dois fogos
depois dos disparos
no espaço durante
onde
                      tiro no escuro
retratos ou a vida do que
num instante, escapa do registro
do desejo, do livro de ocorrências
e queima o filme, o nu, a confissão
no estúdio, still, então
vira vã estátua de vácuo
contra o fundo infinito
sem assinatura?
(p. 129)
Adriana Varejão
POEMAS
I
Uma viagem a descoberto:
ave, aventura
e seus voos cegos!
Sem espelhos retrovisores
só assim
me visto, somente
com a paisagem
e sem assinar meu nome
em nenhuma parte
eu passo
                e me assassino:
sol assim.
(p. 38)
II
Leio, de um só gole
o que não sei:
as instruções de voo
um lance de degraus
no escuro
                      um livro de dados
um palco sem aplausos
um lince de dígitos
disparado, não deixando
indícios, grãos, índices.
Ao azar, sobram as asas
de um desastre, cenários
atos falhos, alguns planos
e um papel em branco.
(p. 49)
Adriana Varejão
III
Vou gota a gota
aos poucos
mas apesar de todo cálculo
e de tanta cautela
acabo não me poupando
pois estou sempre na ponta
do trampolim
e o tempo aí já não cuida
de segurar nada - não sabe -
conter-se nem contar
o que de fato aconteceu:
se foi voo, queda ou mergulho.
(p. 75)
IV
Somos luvas da mesma mão
e somente no delírio
vamos saber qual é o som
do aplauso.
a outra caiu na rua
ou ficou esquecida no hotel
e só no espelho podemos
ensaiar a ilusão e a lembrança
e dar adeus à que se perdeu
e quebrou
almas gêmeas, alianças
algemas, e partiu.
(p. 77)
V
Debaixo da luz do flash
com todos os fósforos
velas e watts acesos
à queima-roupa
a chama de sua nudez
lambe-lambe
e ateia fogo à pele
de papel couché
que se consome e sua
por todos os poros, a cada pose
do corpo ou do incêndio
que se despe.
(p. 93)
Adriana Varejão
VI
Passar a limpo os cinco sentidos.
Apagar com sono e borracha
para usar - todos -
novos em folha
de novo:
sem luvas, óculos, fones
perfumes de meio ambiente
e com a boca livre de lembranças.
(p. 110)
VII
Diante de mármores
e espelhos
que sempre esperam
mesmo quebrados.
Tudo tão magro
e feito a esquadro.
Entre álgebra e fábula
o meu sangue sabe mais
do que este livro conta.
(p. 115)
VIII
Sem gravidade.
Antes de cair, deus algum
ou seu simples desejo
precisa de asas.
Sequer de luz
pois no rascunho
já há risco
                      de fósforos
de rostos feitos de terra
e de erros das estrelas.
(p. 120)
IX
As veias da família
são iguais
e atendem pelo mesmo ramal.
Os pais estão em toda parte.
No escuro, na escuta
nos espelhos
respondendo a todas as chamadas
até quando não são feitas
em voz alta
e o telefone não toca.
(p. 121)
Adriana Varejão
X
Dentro
não se fotografa.
O que vem antes
até o topo
o espectro que nenhum
espelho capta
que pega a pista e larga
mas não deixa marca
impressão digital.
O antirretrato
zero à esquerda
longe do papel da estátua
o pré-fantasma que a luz velou
e perdeu a memória
além do seu próprio negativo:
não.
(p. 125)
XI
Preposições: antes, até, após
por quanto tempo
este crime ficará perfeito
fora de foco entre dois fogos
depois dos disparos
no espaço durante
onde
                      tiro no escuro
retratos ou a vida do que
num instante, escapa do registro
do desejo, do livro de ocorrências
e queima o filme, o nu, a confissão
no estúdio, still, então
vira vã estátua de vácuo
contra o fundo infinito
sem assinatura?
(p. 129)
É incrível a forma como o poema ultrapassa fronteiras e é compreensível em qualquer idioma, na medida em que unifica em uma única linguagem, a alma que é comum a todos.
ResponderExcluirE nós temos a ferramenta de tradução, que reduz o espaço entre as almas dos seres humanos.
Saudações
Es increíble como la poesía rebasa fronteras y se hace entendible en cualquier idioma, ya que se unifica en un único idioma, el del alma que es común a todos.
Y además contamos con la herramienta traductora que acorta los espacios entre las almas de los humanos.
Saludos