Guilherme Gontijo Flores




Guilherme Gontijo Flores, autor do livro Brasa enganosa, nasceu em Brasília, em 1984. É graduado em Letras pela UFES e mestre em Estudos Literários pela UFMG, autor da tradução integral das elegias de Sexto Propércio, lançado no ano passado pela Editora Autêntica.. Professor de Língua e Literatura latina na UFPR. Publicou ainda traduções de As janelas, seguidas de poemas em prosa franceses, de Rainer Maria Rilke (em parceria com Bruno d'Abruzzo), e D'a anatomia da melancolia, de Robert Burton, em 4 volumes (com este último  conquistou o Prêmio Jabuti de tradução). Participa do blog coletivo Escamandro.























BRASA ENGANOSA

debaixo das cinzas
saudade
quase chama corpo
ausente
rosa encarnada estalando
na carne do éter
como se cada
outrora de repente
merecesse ser
novamente
exatamente
agora

* * *

NÃO SE APRENDE A AMAR

o desamar sim
se desaprende
mesmo
aconchegado no extravio do silêncio
sem palavras
sem consolo ou sentido    abraçado
pela profunda presença do fracasso
quando
melhor seria um trago
ou qualquer outro verso
que não seja este


Foto de Daido Moriyama

















arquitetura

The imperfect is our paradise.
Wallace Stevens

mas sobretudo
preparar a brita
que brita não é calma& controlada
conforme pedra ou carne
é pesada
ainda que tratável
quando escrita
melhor
do sem sentido é que ela incita
uma poética
a partir do nada
& assim se assoma
ainda que calada
uma estrutura armada com bauxita
agora venha vida
venha dor
nada se negue
à sua arquitetura
que busca simetria em sua sina
mas não prevê que o risco
de uma flor
– coisa sem nome
que sequer perdura –
possa brotar nas frestas
da ruína

* * *


NÃO BASTA O RIO     murmúrio
adocicado das águas
rumo certeiro     transparência
do olho d’água
desaguar suave sua torrente
não adianta fonte pura
ou perpétuo devir dos rios
como se fosse foz
seu único destino

não basta o rio –
cruzar a vida como esquina
sem banzeiro que revire a via estreita
nem
sorrir pra cantilena ilusória do mar –

carece macaréu em barro & areia
arrancando as árvores revendo
o próprio rumo     estrondo só
sal revoluto
o corpo inteiro em pororoca






















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